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Façam as suas apostas: teremos avanços democráticos sob a tutela dos militares?

Atualizado: 18 de abr. de 2022


Presidente eleito têm viés militar | foto reprodução da internet

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Resumo

Ninguém, em plena consciência, apostava na ascensão de Jair Bolsonaro, na corrida rumo ao Palácio do Planalto. Portanto, é nas perspectivas dos movimentos populares localizados na cidade de Guarulhos - (Movimento contra o Aterro Sanitário no Cabuçu e MTST (Ocupação Hugo Chaves) – que o presente artigo, longe de ser uma análise exaustiva de um futuro governo capitaneado pelo, agora eleito, Jair Bolsonaro, acena pontos convergentes que contribuem para compreender a derrota de uma agenda cidadã certificada em programas sociais como o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), Bolsa-Família, FIES, Peti, ProUNi, Brasil Carinhoso e que agora se vê ameaçada por programas e ideários, que se realmente forem executados, realinhará o Brasil à pauta dos projetos de dependência e subserviência.

Palavras chaves: Brasil, crise brasileira, movimentos populares e eleição.



Introdução

Um estilo bonapartista, claro que no jeitinho bem brasileiro, poderá ser a marca, do governo de Jair Bolsonaro. Seus assessores buscarão forjar a imagem que o consagrou nas urnas. O estilo militar de um homem de poucas palavras, parcos sorrisos, pouco senso reflexivo e de alguém que tem soluções para tudo e a todos. A aspiração de ser o primeiro a se pronunciar sobre qualquer tema na esfera da vida pública, o fato de desejar que sua vontade seja seguida nas esferas dos poderes judiciário e executivo, corre o risco de transformar o Presidente num ditador em potencial.

Diante de inúmeras dúvidas uma podemos excluir: Bolsonaro não governará ao estilo Temer. Neste aspecto não haverá continuidade alguma. Soma-se a isso seu modo de apresentar propostas simplistas aos problemas complexos. Tal simplismo já deu provas de seu elevado grau de desconhecimento dos reais problemas do país. As causas dos movimentos LGBT’s, negros, indígenas foram frequentemente escrachados nas entrevistas, do então, candidato. Acenos à pena de morte e à proposta de popularizar o porte de armas transformaram o ex-capitão e deputado federal em um “salvador” da pátria. Além dos traços pessoais do novo mandante, temos elementos de sobra para acenar algumas perspectivas de seu governo, considerando o malabarismo para compor seu grupo de ministros.

Não apostamos em um viés facista no futuro chefe do executivo. Até o momento, Bolsonaro representa um pensamento de direita. Sua trajetória na vida pública confirma. Sua vitória se deu na conjugação de descréditos com as propostas de conhecidos candidatos e no anseio de que algo novo surgida dos resultados eleitorais. Mas não há nada que o faça merecedor e defensor de um modo facista de governar. Tudo, até o momento, está muito aberto. Muitas disputas - internas e externas - estão para acontecer.


Perspectivas do novo governo

A imagem de ser um político antissistema foi muito bem vendida. Não poucas vezes o ouvimos recorrer à frase do jurista e ex-presidente do STF, um dos responsáveis pelo esquema de corrupção do Mensãlao, Joaquim Barbosa, de que o "único parlamentar que não recebeu propina foi Jair Bolsonaro". Bravatas de lado, o presidente terá que encarar as resistências do poderoso sistema que pretende destruir: os fortes lobbys no parlamento nacional, o poder extrapolante do judiciário e, algo que lhe pode tirar ainda mais o sono, as grandes corporações financeiras, industriais, agrárias, comerciais e de comunicações. Sem contar o interesses famigerados, sem limites por verbas de propagandas oficiais das igrejas católica e neo-pentecostais. Quando o assunto é combater oligopólios uma ação pode prevalecer sobre outras, estabelecer o fim de uma tendência, ou até formar um novo grupo, uma nova tendência.

O governo de Bolsonaro não largará uma contínua e renovada campanha contra a corrupção. Todo o conjunto da crise terá um responsável único: o PT, tendo Lula à frente. Bolsonaro representa a tábula rasa que devolva ao povo ações de um governo que atue contra o sistema de corrupção, garanta emprego, segurança e coloque o país nos trilhos. Com base neste tripé, seu governo terá garantido um importante aval popular por um bom período de tempo e dificultar a recuperação de propostas de partidos e movimentos ligados à uma agenda mais de esquerda.

Há de se ver uma significativa ofensiva na área da segurança pública, articulando e liberando a ação das polícias contra a criminalidade comum. Prender, matar e propagar as ações repressoras serão métodos corriqueiros.

A tão propalada e desnecessária reforma da previdência que legitimará mais dinheiro para quem já o possui, legitimando o incômodo foço social de ricos cada vez mais ricos e pobres cada vez mais pobres, será vendida ao povo como uma ação governamental posta em prática para combater os privilégios dos privilegiados. Esta reforma deve ser posta em votação ainda no primeiro ano de governo. Gostaria de estar enganado, mais um forte aparato ideológico de cunho conservador está sendo orquestrado para dividir a opinião pública. Recentemente ouvi de um jovem eleitor duas chocantes declarações: o governo estará agindo certo se tirar o 13º salário. Afinal, ele precisa pagar a dívida pública. Uma segunda, e tão alarmante como a primeira: toda e qualquer oposição neste momento a Bolsonaro não deixa de ser uma orquestração de partidos de esquerdas corruptos. São ideias como estas já disseminadas e sustentarão a guerra de informação visando coroar vitoriosos em honestos e capacitados agentes políticos. Podemos prever tempos difíceis para as oposições.

Pelo menos seis aspectos são possíveis de serem elencados quando o assunto consiste em saber porque milhões de pessoas creditaram seus votos ao candidato do nanico partido PSL:

1) Bolsonaro não representa nada em termo de cacife políticos. Embora esteja na vida publica há quase 30 anos – 27 deles como parlamentar – o atual presidente nunca ocupou a coordenação de uma comissão na Câmara dos Deputados. Como ele mesmo alardeou durante a campanha "sempre esteve ligado ao baixo clero". Posição esta tida sem nenhum destaque junto ao grupo de Deputados. Bolsonaro não pode ser compreendido como líder ou um catalisador de anseios populares. Sua vitória deve ser compreendida como uma confluência de descrédito com lideranças tidas como tradicionais e frequentemente expostas por parte da mídia tradicional. Nesse ponto, a campanha pautada no "tudo, menos o PT" não deixa de ser um importante ingrediente, ou mesmo, a cereja do bolo. Os resultados das eleições municipais de 2016 foram desastrosas para os partidos de centro-esquerda.

2) Há, em torno dele, muita mobilização mas nenhuma organização. Não se vê organizações representativas da sociedade civil ao redor das propostas de Bolsonaro. Grupos ligados aos setores produtivos na esfera das montadoras, do agronegócio, do universo da industria cultural e cientifico não se sentiram atraídos às propostas de campanha. Claro e ficou evidente que tais setores queriam, e até ensairam coro ao candidato Geraldo Alckmin do PSDB, mas sem sucesso algum.

3) O presidente eleito logrou vencer no auge de uma “tempestade perfeita”. A crise econômica que bateu forte no segundo governo de Dilma, se prolonga até nossos dias. Todo o curso do processo que culminou com o golpe parlamentar que afastou a presidência Dilma se arrastou por nove meses. Exatamente, do dia 2 de dezembro de 2015 a 31 de agosto de 2016 o país, que já acumulava dados alarmantes na esfera da violência, desemprego e denúncias de corrupção ficou praticamente paralisado. Nossos olhares se voltaram para as notícias e manifestações ocorridas em Brasília. A "tragédia política brasileira, como foi com Vargas e com Jango, culminando com a ditadura militar. Agora, no lugar dos tanques e das baionetas, funcionam as tramóias parlamentares" (Boff, p. 111).

4) O crescimento da oposição a mudanças progressistas teve um crescimento alarmante. Não é de hoje que os partidos políticos PSDB e MDB seguem dando sinais de uma ferrenha oposição aos planos de governos petistas. Incapazes de crescerem junto aos movimentos organizados esses dois partidos foram os sustentáculos de grandes manifestações de ruas. Em muitas delas, as criticas ao modo petista de governar foram frequentes.

5) Bolsonaro, tido como presidente “Meme” alcançou a suscetibilidade das pessoas. Pela primeira vez uma campanha eleitoral se deparou com o mundo irreal criado por peritos. Sobraram conteúdos falsos disparados por robôs difamando concorrentes. Empresas apareceram coletando falsamente opiniões. Criaram conteúdos falsos e perfis foram disparados via whatsapp. Nas redes sociais pairaram um verdadeiro vale tudo. As informações ficaram tremendamente segmentadas e sem credibilidade. Os fatos deram lugar as emoções e redes de mensagens. Todos os esforços foram criados para confundir. Bolsonaro, mesmo advertido, insistiu na criação do Kit Gay, da Escola sem Partido, na proibição do aborto e na Escola sem Partido.

6) Um último aceno fica por conta da precariedade da equipe de governo de transição, disputas entre os diferentes setores do governo (evangélicos, militares, políticos profissionais, lobistas etc), conseguirá reorganizar o sistema político? Congresso, partidos? Vai manter o discurso direto através das redes sociais? E a grande mídia monopólica como TV Globo, saberá ficar no seu lugar? São questões que a partir de 1 de Janeiro saberemos se irão ou não comprometer os planos do novo governo e como serão superadas. Até o momento o que vimos foram muitas promessas, a maioria delas, todas difusas e superficiais. Sem contar o famigerado toma lá dá cá corriqueiro na cultura política.

Diante de propostas conservadores, a resistência. Esperar o quê?

O primeiro passo de um governo liderado por Jair Bolsonaro será o esforço de superar os obstáculos frente à retórica e às intuições de que o povo elegeu de fato algo novo. Incólume. Avessos aos velhos acordos de bastidores que transformaram o Congresso Nacional em um autêntico balcão de negócios. Em um nefasto toma lá dá cá.

Oportuno citar alguns desafios que se encontram escondidos atrás da porta. Trata-se de assuntos que só serão vistos quando o novo chefe do executivo sentir o peso e valor da caneta:

  • Crise econômica persistente,

  • Desemprego conjuntural e estrutural,

  • Insatisfações das classes médias e dos pequenos empresários,

  • Insatisfações populares com a baixa qualidade e oferta de serviços públicos,

  • Acelerada retirada de direitos, com uma enraizada violência criminal, com as aspirações frustradas da juventude das periferias diante da elevada taxa da desindustrialização.

Soma-se os mais de trinta anos de aprendizados, de organizações, de vitórias somadas, muitas vezes as frustrações dos movimentos populares, partidos políticos, juventudes, sindicatos e setores do empresariado. A sociedade brasileira teve oportunidades singulares e aprendeu a se organizar diante de planos políticos que acenaram para a perda de direitos. Não será fácil impor um cala boca, como nos anos de chumbo, por mais nostalgia dos militares que uma pequena parcela da população demonstrou ter. Junto aos movimentos populares a palavra de ordem não pode ser outra que não seja a de resistência, a de ninguém larga a mão de ninguém.

Não foi pequena a parcela do lado dos perdedores. O PT segue como a maior legenda política no campo da esquerda. Sua força pode ser comprovada na governabilidade conseguida em alguns Estados e na maior bancada na Câmara dos Deputados. A manutenção na prisão de seu maior líder, Lula, começa a fazer estragos. Inúmeras lideranças e organizações mundiais denunciam todo o arsenal jurídico e as artimanhas do Ministério Público utilizadas para afastá-lo do último pleito, diante de pesquisas eleitorais que o davam como vitorioso, ainda no primeiro turno. O movimento Lula Livre não dá sinais de arrefecimento.

Novas lideranças surgiram oriundas dos sindicatos, movimentos estudantis e camponeses. Dois dias após declarada a vitória de Jair Bolsonaro, os partidos do Psol e PCdoB, capitaneado por suas liderenças Manuela d´Ávila e Guilherme Boulos – ambos derrotados no pleito - e a Frente Povo sem Medo colocaram mais de 10 mil manifestantes que prometeram resistir diante das ameaças e propostas conservadoras.

Conclusão

Ideias de extreme direita, por anos estiveram recolhidas e envergonhadas de expor em público suas convicções e planos. Mas ocorre que desde as movimentações de 2013, onde tudo começou por uns simples 0,20 centavos no preço das passagens, passando pelo Tchau Querida, até chegar ao espantoso e vexatório PowerPoint em que Lula é exposto como chefe de quadrilha e a cadeia deve ser sua nova residência, na desgovernada Operação Lava Jato, a direita se fortaleceu e agora acessou ao núcleo central do poder.

Por tabela o cenário ficou mais complicado. Os militares voltaram ao poder pelo sufrágio popular. Não é bom esquecer de que Sarney, Itamar Franco e Temer eram vices de seus titulares e o general Mourão, vice-presidente, já deu declarações bombásticas no que se refere a tirar direitos dos trabalhadores e de que jamais viajará no mesmo avião na companhia do presidente.

O Brasil parece ter sido a bola da vez, o campo perfeito para a realização radical de um modelo econômico que comprove as teses do neoliberalismo, até as últimas consequências. Suas reservas petrolíferas, suas reservas naturais e riquezas minerais, além do vasto campo disponível para agricultura legitimam as grandes corporações financeiras a famigerada escolha.

O Estado seguirá sendo laico. Não está tal princípio constitucional ameaçado. Veremos, sim, constantes acenos e afagos por parte do poder serem correspondidos por diferentes lideranças religiosas que não titubearão em posar de mãos dadas, serem fotografadas e até rezarem juntas, em um cenário de total subserviência a um certo tipo de divindade: o capital, agora, disfarçado entre batinas e paletós.

Grandes mudanças já estão em cursos. A fratricida lei que proíbe, por 20 anos, investimentos na esfera da saúde, educação e moradia, já aprovada no governo Temer, a PEC 55. A reforma trabalhista que não deu sinal algum de garantia de emprego com carteira assinada, pelo contrário. Piorou ainda mais as relações do capital com o trabalho. Assistimos o fim do trabalho em benefício do grande e controlador poderio financeiro.

Não será fácil enfrentar a longa noite escura de nos aguarda. Não se implementa um projeto de cunho tão conservador, como o representando em Bolsonaro, por um curto período. Veremos o Brasil das elites. Mas, do outro lado da moeda, estarão os pobres e marginalizados, expondo suas cicatrizes denunciadoras de que no banquete do farto e improdutivo capital, seguem sendo excluídos e vitimados. Deste lado deve estar humanistas, religiosos, mulheres e homens de boa vontade que teimam em manter acesas as chamas da esperança e de dias melhores que poderosos teimam e ensaiam apagá-las.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BOFF, L. Brasil: concluir a refundução ou prolongar a dependência. Petrópolis: Vozes, 2018.

DOWBOR, L. A era do capital improdutivo. São Paulo: Outras Palavras & Autonomia Literária, 2017.

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Professor em Teologia Bíblica, ITESP, Assessor das Pastorais Sociais

e Secretário Regional da Campanha da Fraternidade,CNBB-Sul I.

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