Introdução:
O esforço empreendido pelas tribos israelitas na conquista e ocupação das terras é tema principal no livro de Josué. Até chegar à sua redação final, antigos relatos nascidos no ambiente da família, dos trabalhadores do campo, dos sábios atuantes na corte do rei e dos sacerdotes em seus diversos santuários, sofreram um longo processo de contar e recontar, escrever e reescrever determinados fatos da história de Israel e dos povos circunvizinhos.
A primeira tentativa de reunir essas antigas tradições históricas, a maioria do reino do Norte (destruído pela guerra de 722 a.C), aconteceu durante a reforma empreendida pelo rei Josias (640-609 a.C.). Com base na solene promulgação do livro do Deuteronômio (12-26), na época compreendido como “Livro da Lei” e “encontrado no Templo de Javé” (2Rs 22,8), a reforma consistiu, aos olhos dos grupos dirigentes e proprietários de terras instalados na cidade de Jerusalém, em realizar os desejos de um Deus – chamado Javé - devotado por Israel e desencadeou mudanças na vida religiosa e social. Entre elas, a centralização do culto em Jerusalém, a destruição dos santuários nos lugares altos, a perseguição e morte dos sacerdotes ligados às divindades estrangeiras, e a proibição das imagens e do culto aos deuses familiares, bem como a oficialização da páscoa como festa nacional celebrada na capital Jerusalém (cf. 2Rs 23,4-25).
É a partir do projeto de Josias, que deseja integrar o reino do sul e o território do antigo reino do norte em uma única unidade política – Israel –, em torno de uma única divindade – Javé – e sob um só comandante – descendente davídico –, e como legitimação dessas novas fronteiras que os leitores devem compreender as inúmeras guerras narradas no livro de Josué. As “guerras de Javé”, à primeira vista, assustam. Afinal, nunca houve e não existirá nenhuma ação bélica e invasora, conquistadora e destruidora aprovada por Deus. Os leitores se deparam, sim, com relatos fictícios no desejo de animar, integrar e determinar as ações expansionistas e controladoras da reforma deuteronomista, empreendida por Josias.
Um bom exemplo dessa história narrada para exaltar Javé, Deus de Israel, e o povo residente em Judá, pode ser verificado na época em que os hebreus começam a ocupar as terras na região. Em meados do século XII a.C. as grandes cidades-estado cananeias já não existem mais. Jericó, outrora pertencente aos cananeus, por exemplo, não passava de um monte de ruínas. Seu esplendor desaparecera há mais de dois séculos (Js 6).
As vitórias surpreendentes diante do forte inimigo, que se vê incapaz de vencer um pequeno e despreparado exército que luta em nome dessa divindade, justificam os esforços na ocupação e expansão das fronteiras no governo do rei Josias. Israel não tem nada a temer, pois Javé luta em seu favor (Dt 7,21; Js 1,9). Eis os brados que encorajam e legitimam a monarquia sediada em Jerusalém.
Todo conteúdo do livro de Josué só recebe sua forma definitiva na volta do exílio babilônico (597-536 a.C). Em meados do ano 400 a.C, época da redação final, o controle exclusivo do templo e da cidade de Jerusalém estava nas mãos dos sacerdotes que, por meio do regime de governo pautado pela teocracia, buscam sustentar os ideais de um povo escolhido e protegido por Javé, agora compreendido como “Deus Único” (Dt 6,4-9). Na ocasião, os sacerdotes recolhem e organizam tradições dos sábios deuteronomistas escritas no âmbito da reconstrução do templo, em uma sociedade que vive sob o sistema templo-estado, e são impulsionados a seguir fielmente todos os estatutos apresentados por Javé.
O livro de Josué tem a posse da terra como tema central e pode ser dividido em cinco partes, seguindo o próprio texto: a) primeira parte (Js 1-12): identificação do território e as conquistas; b) segunda parte (Js 13-21,45): distribuição das terras entre as tribos, segundo a necessidade de cada uma; c) terceira parte (Js 22): Retorno das tribos e solidificação da aliança entre as doze tribos; quarta parte (Js 23): um discurso de despedida, feito por Josué; d) quinta e última (Js 24): a importante assembleia de Siquém.
Notas
1-12: Identificação e conquista das terras
Conhecer os territórios é o tema apresentado nessa parte do livro. Josué, apresentado como único líder no lugar de Moisés, acompanha as tribos em combate. As vitórias se afirmam no grau de sua obediência a Javé.
1,1-9: Josué, um novo líder
A figura de Josué, citada nos textos do Deuteronômio (Dt 1,38; 3,21.28; 31,3.7.14, 34,9) e retomada logo na introdução do livro (Js 1,1), ressalta a unidade entre essas duas obras redigidas pelo mesmo grupo de autores. A redação teria ocorrido em meados do ano 400 a.C., época em que os sacerdotes impuseram um rígido governo teocrático, sediado na cidade de Jerusalém. O critério de pertença ao povo de Israel passa pela pureza étnica e no apego e observância incondicional à Lei, compreendida como Torá. A geografia apresentada, delimitando as fronteiras de Israel, por meio do controle absoluto da região, jamais correspondeu ao que foi exposta nos versículos 4-5. A delimitação fronteiriça também é destaque nas narrativas proféticas de Ezequiel (Ez 47,13-23) e Zacarias (Zc 9,1-8), ambas redigidas durante o projeto de restauração empreendida por Esdras e Neemias.
1,10-18: A travessia do Jordão
Javé, compreendido como divindade nacional de Israel, bem como a observância radical à Lei, foram os alicerces para as ações do rei Josias nos anos em que reinou Judá (640–609 a.C.). Agora, toda a terra pertence a Javé e não mais ao rei. Eis uma forte justificativa das ações bélicas adotadas por esse rei de Judá (Nm 32,20-29; Dt 13; 17,12).
2,1-24: Espiões em Jericó
Nos capítulos 2 e 6 são retomadas antigas lendas, oriundas das mais diferentes tribos, espalhadas ao redor das cidades de Jericó e Guilgal. O discurso de Raab bem demonstra ser uma releitura das declarações de fé no Deus de Israel (cf Dt 26,5b-9; Js 24,2b-13). A narrativa destaca a adesão de uma estrangeira à divindade defendida pelos filhos de Israel (2,1). Ressaltar a grandeza de Javé junto às nações estrangeiras foi um forte desejo no projeto empreendido por Josias (Ex 14,21; Nm 21,21-26; Dt 4,39). As nações estrangeiras devem confessar que somente Javé tem o poder de salvar e segui-lo é o princípio para preservar a vida (Js 6). Os textos bíblicos guardaram a memória emblemática de Raab, ao ponto de preservá-la na genealogia de Jesus e em outros textos do Novo Testamento (Mt 1,5; Hb 11,31; Tg 2,25).
3: Travessia do Jordão
Os capítulos de 3-5 formam uma unidade literária. A narrativa acontece em um grande ato litúrgico ao congregar, sob as ordens de Josué, sacerdotes, homens de guerra e todo o povo. Observam-se os seguintes elementos: força simbólica da Arca da Aliança (Js 3); a presença protetora dos sacerdotes responsáveis em carregar a Arca e as dozes pedras trazidas até Guilgal (Js 4), o ritual da circuncisão e a celebração da páscoa (Js 5).
3,1-17: Passagem do Jordão
A narrativa, intencionalmente reconstruída, assemelha-se ao relato da travessia do Mar Vermelho (Ex 14,21; Sl 114,3; 136,13-14). Para os sacerdotes responsáveis pelos cultos e serviços administrativos do templo de Jerusalém, a Arca da Aliança de Javé (apresentada como receptáculo dos textos sagrados), foi o fator preponderante para manter a unidade e identidade nacional. Não é em vão que a Arca da Aliança é apresenta como objetivo sublime de culto e proteção à comunidade no pós-exílio. Sacerdotes e levitas estarão sempre à frente guiando, congregando e identificando aqueles que pertencem ao povo eleito.
4,1-24: A Arca e as doze pedras do Jordão
O aspecto litúrgico reforça o desejo de unir a comunidade dispersa, fraca e desacreditada após a tragédia do exílio imposto pelo país da Babilônia (597-536 a.C). Eis, agora, o novo êxodo. Retornar a pisar em terras de Judá terá o sentido de um novo tempo. Guilgal significa “círculo de pedras”. Possivelmente, seria um termo para delimitar determinada área para a realização do culto, já em época dos cananeus. A elevação de Guilgal como primeiro santuário dos israelitas, após cruzar o Jordão, visa justificar a reconquista dos territórios em épocas pós-exílicas (Dt 11,29-32). O narrador atualiza a saga do êxodo e concretiza as promessas feitas em Js 1,12-15.
5,1-9: Temor diante dos filhos de Israel
Na época do bronze recente (1550 a 1220 a.C.), a prática de circuncidar a carne do prepúcio era prática nas comunidades semitas (cf. Gn 17,9-14). No pós-exílio o gesto receberá um aspecto religioso servindo para legitimar a pertença ou não às tribos israelitas, seguido da estrita observância da lei, da exclusividade do sábado como dia santo, bem como as proibições alimentares. Na monarquia de Saul, Guilgal será importante centro político e religioso: um santuário disponibilizado para a prática do sacrifício diante de Javé (1Sm 10,8; 11,15; 15,21.33). Sacrifícios esses, mais tarde, condenados pelos profetas (Os 12,12, Am 4,4).
5,10-15: A menção dos festejos pascais é uma reedição de Ex 12,6. A festa, nascida em ambiente familiar, será mais tarde celebrada e centralizada, por meio de um decreto real, em Jerusalém, como está determinada em 2Rs 23,21. O diálogo entre Josué e o chefe das armas de Javé assemelha-se às experiências vividas anteriormente por Moisés (Ex 3,5). A figura do anjo em forma humana e compreendido como mensageiro divino, será amplamente difundida em textos tardios, sob influência persa, durante o regime teocrático defendido pelos sacerdotes no templo de Jerusalém (cf. Jz 13,6.10; Ez 43,6; Dn 9,21).
6,1-25: A conquista de Jericó:
Em torno do ano 6.800 a.C., a arqueologia aponta a existência de assentamentos na região de Jericó. Não há dúvidas de que a cidade exercera importante papel no cenário comercial por estar localizada à beira do rio Jordão e de grandes nascentes. Um verdadeiro oásis. A partir de 1700 a.C, o apogeu de Jericó desaparecera. A conquista da cidade é uma narrativa de cunho sacerdotal com forte conotação litúrgica, possivelmente nascida de antigas cerimônias feitas ao redor do santuário de Guilgal. Para isso, é oportuno perceber a insistência pelo número sete (vv. 4,8,13,15,16), sacerdotes (vv.4,6,7), trombetas (vv. 4,6,8,9,13,13), seguidores da arca (vv.4, 8) e o forte “grito” do povo (vv.10,20).
6,26-27: Possivelmente, um pequeno fragmento textual somado à narrativa. Amaldiçoar será um ato típico dos sacerdotes e levitas, encarregados pelos conteúdos litúrgicos no período pós-exílico (cf. Dt 18,1; 27,1426).
7,1-26: A cobiça de Acã
O termo “condenado ao anátema”, citado cinco vezes no capítulo (vv. 1,11,12,13,15), destaca o gesto de apossar-se dos despojos de uma cidade. Depois de findada a “guerra santa”, os objetos recolhidos eram levados ao templo e entregues aos cuidados dos sacerdotes, como propriedades divina, segundo determinação da lei (cf. Dt 13,16-19; 20,16-18; Lv 27,28). Possivelmente, o texto destaca um hábito frequente nas guerras empreendidas pelos guerreiros na época do rei Josias.
8,1-29: Tomada de Hai
Assim como Jericó, durante o século XII, a cidade de Hai, (ruínas, em hebraico), fora destruída em meados do ano 2400 a.C., sendo sua conquista um relato apologético com a finalidade de encorajar os projetos da reconstrução em época pós-exílica. Hai será reconstruída nos governos teocráticos de Neemias e Esdras (Ne 7,32; Esd 2,28).
8,30-35: Sacrifício e leitura da lei em Ebal
A narrativa, repentinamente, interrompe os atos de guerra em Hai para destacar a ação litúrgica em um “altar para Javé” (v.30), conforme determina a Lei (Ex 20,24-26; Dt 27,5), reunindo todos os filhos de Israel – anciãos, escribas, juízes, sacerdotes levitas, povo e estrangeiros ao redor da Arca da Aliança (vv.32-33). “Benção e maldição” (v. 34) são resultados do grau de apego do povo às descrições da Lei (cf. Dt 11,26-28; 27,14-26; 28), práticas muito em uso no período teocrático, época em que sacerdotes passaram a administrar a vida social e religiosa na Judeia.
9,1-27: Coalizão contra Israel
No desejo de submeter os gabaonitas a Israel, o autor relê a conquista da Transjordânia feita por Moisés (Nm 21,21-35), agora, no ideário expansionista de Josué. Segundo o cronista, Gabaon registrou a vitória da forças de Davi contra os filisteus (1Cr 14,16) e será um dos locais de culto do rei Salomão (1Rs 3,4). A especificação das tarefas serviçais dadas aos gabaonitas é um aspecto da narrativa pós-exílica, período em que, sob as ordens dos sacerdotes, é iniciada a reconstrução do templo coincidindo com a reconstrução da cidade de Gabaon (Ne 3,7; 17,25; Esd 2,1.36-39).
10,1-15: A batalha de Gabaon
A pujança arquitetônica e econômica da cidade de Gabaon desapareceu quando tropas assírias, sob o comando de Teglat-Falasar III, em meados de 734 a.C. realizaram as primeiras incursões ao norte de Israel. O sol e a lua (vv. 12-13), duas grandes luminárias, ligam-se às divindades estrangeiras assírias e, aqui, passam a colaborar com a estratégia militar adotada por Josué. A narrativa engrande Javé, divindade nacional em Judá. O poema é muito semelhante às antigas canções exaltando antigas façanhas heróicas (cf. 2Sm 1,18-27).
16-27: A localização de Maceda é incerta. A narrativa não deixa de ser um desenvolvimento da cena anterior (Js 10,1-3), no desejo de elevar o poder de Josué frente aos inimigos que, à primeira vista, são impossíveis de serem vencidos.
28-43: A lista dos reis vencidos e a destruição das principais cidades acenam para o projeto expansionista de Josias. A lista das cidades subjugadas pelos guerreiros de Josué é fictícia.
11,1-23: A conquista das terras do norte
O grande sonho do jovem rei Josias foi expandir os limites territoriais do seu reinado em direção ao Norte. Suas atividades em Betel (2Rs 23,15), em terras da Samaria (2Rs 23,18) e em Meguido (2Rs 23,29), assemelham-se aos projetos do rei Davi (cf. 2Sm 8,2-9; 8,13-18). As conquistas na região Sul, narradas em Js 10, formam uma unidade literária com Js 11. Na descrição das vitórias ao Norte (Js 11). Textos egípcios do século XIX a XVIII a.C. referem-se a Hasor como principal cidade asiática. Ela foi conquistada pelos assírios em 752 a.C (cf. 2Rs 15,29). Seu domínio pelas forças de Josué é um artifício literário visando legitimar o expansionismo posto em prática durante a reforma.
12,1-24: Recapitulação: derrotados ao leste do Jordão
A lista apresenta cidades conhecidas na época do reinado de Josias. O narrador, concluiu a primeira parte do livro (Js 1-12), apresentando cidades conquistadas por Moisés (vv.1-6) e reis vencidos por Josué (vv. 7-24).
13-21,45: Distribuição da terra
Os capítulos de 13 a 21,45 formam a segunda parte do livro. As guerras não estão mais em foco, mas os esforços para um acordo de distribuição entre as doze tribos de Israel. A terra pertence a Deus e, por esse motivo, reparti-la deve ter como princípio a garantia de sobrevivência das tribos e a perpetuação do projeto de igualdade firmado entre Javé e Israel.
13.1-28: Terras jamais conquistadas
A narrativa apresenta várias regiões onde viviam inúmeras tribos e clãs. O cenário geográfico parece ter como objetivo justificar a reintegração de terras às tribos ainda sem territórios demarcados, uma redação tipicamente deuteronomista. Por isso, a preocupação pelas terras a serem conquistadas (vv. 2-3; 5-6). Ezequias, quando rei de Judá (716-687 a.C.), venceu os filisteus em uma coalizão anti-assíria.
29-33: Nas antigas tradições, os levitas parecem gozar de relativo prestígio junto ao povo (Ex 2,1). Fato legitimado por estarem ligados às práticas cultuais (Ex 32,25-29) e não possuírem terras como herança (Dt 12,12; 14,28; 26,12-13; Js 13,14.33). Até o retorno do exílio, os trabalhos dos levitas aparecem associados ao cuidado das atividades religiosas, mas sempre subalternos aos sacerdotes (Ez 44,28-29; Dt 18,6-8). Após a reforma de Esdras serão designadas aos levitas quarenta e oito cidades (Js 21), no desejo de harmonizar a partilha da terra entre as tribos.
14,1-5: Divisão das terras a oeste do Jordão
O narrador faz uma releitura da partilha apresentada em Nm 34. A citação do sacerdote Eleazar e Josué, em companhia dos chefes do povo (vv. 1-5), serve de introdução aos relatos sobre os territórios repartidos (Js 14,6-19,50).
14,6-15: A parte de Caleb
O processo de ocupação do território, por parte das tribos de Israel, aconteceu de forma gradual. Uma antiga tradição sobre um herói de nome Calubi, israelita (1Cr 2,9), irá se somar às tribos de Judá, já com o nome de Caleb (cf. 1Cr 2,18). Mais tarde, a narrativa o apresenta como um dos enviados para o reconhecimento de Cannã e, por isso, merecedor de estar entre as tribos responsáveis pela partilha dos territórios (cf. Nm 34,19).
15,1-12: A herança de Judá
A demarcação das fronteiras do território de Judá surgiu do resultado da união de várias tradições vindas de diferentes clãs, como encontramos em relação aos quenitas e calebitas (Jz 1,16; 4,1; Js 14,13-14). A narrativa parece ser uma releitura pós-exílica considerando a primazia declarada em Gn 49,8-12. Judá será a única região a perpetuar a aliança com Javé.
16,1-10: Tribo de Efraim
As fronteiras apresentadas na unidade literária, formada pelos capítulos 16 e 17, não deixam de ser uma antecipação dos limites do reino do Sul, território de Israel, que estará sob a liderança dos filhos de José (cf. Gn 49,22-26; Dt 33,13-17). A narrativa demarca as terras pertencentes aos filhos de José (vv. 1-4), detalha as terras de Efraim (vv. 5-10) e a herança firmada com a tribo de Manassés (Js 17).
17,1-18: Tribo de Manassés
A reivindicação de parte na herança das cinco filhas de Salfaad (v.3), está construída sobre relato de Nm 26,33; 27,1-11 e 36,1-12, tendo como elemento primordial a pessoa de Moisés, representante máximo da lei. O relato de “cortar árvores” (vv. 15.18) é anedótico ao demonstrar o interesse do redator final em manter a tradição sobre as doze tribos para um desfecho na história de Josué (Js 16,1-4).
18-19: Terras para as sete tribos
Silo, à 18 km ao norte de Betel, cercada por cadeias montanhosas, tornou-se o centro das assembleias tribais e o principal santuário ao norte de Israel (1Sm 1,1, Ex 23,14). Foi, sem dúvida, a região que viu surgir a monarquia na pessoa de Saul (1Sm 11,1-11). A cidade foi destruída pelos filisteus no ano 1050 a.C., segundo estudos arqueológicos. O profeta Jeremias refere-se a Silo, já destruída, para criticar os cultos praticados em Jerusalém (Jr 7,12) durante o reinado de Joaquim (609-598).
20,1-9: Seis cidades de refúgio
A narrativa, já em época pós-exílica, designa seis cidades em seis diferentes regiões que servissem de abrigo e garantissem a vida do infrator. O homicida involuntário necessitava fugir dos parentes da vítima (cf. Ex 21,13; Nm 35,9-14).
21,1-45: Cidade designada aos levitas
Tradições posteriores, possivelmente da época em que a vida social esteve sob o controle sacerdotal, designaram aos levitas o direito de possuir determinadas propriedades, contrariando as prescrições em Nm 18,20-32.
22,1-9: Fidelidade à Lei e garantia de prosperidade
A centralidade da Lei foi marca registrada na volta do exílio. Nesse sentido, o narrador legitima o sucesso da empreitada devido ao apego e observância à Lei (vv. 1-8).
22,10-34: A tradição deuteronomista ofereceu harmonia a um possível conflito entre as tribos ao buscar uma explicação para a existência de um altar fora de Jerusalém, na época pós-exílio. O altar não foi para a prática do sacrifício e holocausto, mas um significativo emblema memorial, recordando os grandes feitos javistas em prol dos filhos de Israel.
23,1-16: Discurso de Josué
Os capítulos 23 e 24 são acréscimos recentes e concluem o livro. A tradição deuteronomista não vacila em creditar o sucesso de Josué à observância dele a todos os preceitos de Javé.
24,1-33: Morte de Josué e assembleia em Siquém
O pacto final é narrado em um forte ambiente litúrgico na histórica cidade de Siquém. Desde o terceiro milênio a.C., a cidade já era mencionada como um importante lugar estratégico, por estar em uma região fértil e de encontro das rotas comerciais pelos egípcios. Propositadamente, o narrador final escolhe o local para unir Josué às tradições patriarcais, dando a ele legitimidade e indicando o rumo futuro a ser seguido por Israel (Gn 33,18-19; 48,22). Siquém legitima também a adesão, por parte de outros clãs, ao javismo, indispensável para justificar identidade e felicidade da nação de Israel (24,2-13).
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