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Introdução ao Apocalipse: A boa nova em tempo de perseguição

Atualizado: 22 de mar. de 2022


fotomontagem: André Mello Occulate (KASEcom)

1. Introdução


a) Origem da literatura apocalíptica

A literatura apocalíptica nasce no pós-exílio, por volta de 536 a.C. Como literatura, será entre os séculos II aC – II d.C, seu período áureo. Numa situação de crise, de destruição de suas instituições, o povo de Judá precisa ser reorganizado. Surgem dois projetos. O projeto da pirâmide, ou projeto oficial, que tenta reorganizar o povo através das instituições: Templo (culto), lei, raça (Esdras, Neemias; Crônicas e outros). Ao mesmo tempo ressurge o projeto da sociedade tribal que busca reorganizar o povo através de grupos de resistência e solidariedade, ajudados pela literatura sapiencial e através da literatura apocalíptica (textos de Daniel, Joel, Zacarias, Isaías (partes do Primeiro Isaías, do Segundo e todo o Terceiro Isaías) e outros. Portanto, a literatura apocalíptica nasce no tempo dos grandes impérios. É a resistência esperançosa das pequenas comunidades, anônimas, diante dos grandes opressores.

O objetivo do Apocalipse é reconstruir a consciência coletiva e a prática social. O movimento apocalíptico nasce do lado de quem não tem controle da história, da vida. Ou seja, do lado dos/as excluídos/as. Esse pessoal acredita que embora estejam perdidos aqui, no mundo debaixo, no mundo de cima, Javé, o Senhor da história, tem controle.


b) O que é Apocalipse?

A palavra ΄Αποκάλυψις, (Apocalipse) é um verbete grego que significa revelação – tirar o véu. Mostrar o verdadeiro sentido da história. Recuperar a esperança. Deus é o Senhor da Vida, ele é o dono da história.


c) Características da literatura apocalíptica

· Demonstra que é tempo de perseguição;

· Faz uma releitura da história a partir do passado, do presente e do futuro, no qual Deus faz um grande julgamento – Deus castiga;

· Quer revelar a presença de Deus no meio dos acontecimentos;

· Usa uma linguagem simbólica e poética: visões, mitos. São textos de época de perseguição. Os nomes de pessoas, lugares, datas são simbólicos e, em geral, tirados do Primeiro Testamento. Os mitos contados possuem muitos sentidos e estão sempre abertos a novas interpretações. O apocalipse cria mitos libertadores e subverte os mitos dominantes;

· Apresenta a luta entre o bem e o mal, através de uma visão cósmica do mundo: céu e terra. A luta que acontece no céu, se reflete na terra.

· O Apocalipse nasce do lado de quem não tem o controle da história, ou seja, os/as excluídos/as


d) Época, local, autoria do livro do Apocalipse (quem escreveu, onde e quando)

Época: o Apocalipse foi escrito em etapas, que vão do ano 64 até 95.

· Etapas da elaboração do livro:

· Bloco 1,4 – 3,22: introdução e cartas às comunidades: exigência de fidelidade e compromisso. Redação do ano 95.

· Bloco 4,1 – 11,9: A Boa Nova ou Novo Êxodo. Anúncio da libertação. Redação do ano 64.

· Bloco 12,1 – 22,9: a Boa Nova: julgamento da história. Redação do ano 95

Local: o livro do Apocalipse foi escrito em alguma região da Ásia Menor, provavelmente nas proximidades da comunidade de Éfeso.

Autoria: O livro do Apocalipse foi escrito por um cristão que havia sido judeu. O nome João era muito conhecido na época. Por outro lado, o autor se apresenta como integrante de um grupo de profetas (22,9), “testemunha da Palavra de Deus e do testemunho de Jesus Cristo” (1,2.9); “servo de Jesus Cristo” (1,1; 22,6). Em 1,9 ele se apresenta como “irmão e companheiro de seus ouvintes”.

e) A realidade da Ásia Menor, na época em que foi escrito o livro do Apocalipse

– contexto internacional (Ap 18,9-29)

· O livro do Ap foi escrito no contexto do Império Romano que assumiu o sistema helenista, cujo modo de produção era o escravagismo. Qual o interesse desse sistema? Ver Ap 18,11-13 [F1] . O mercado, o comércio, o lucro. As pessoas não contam.

· Para conseguir seus interesses, eles organizam as cidades, as “polis”, para que haja mais fluxo do mercado. (lembrar a construção da Decápole... Mc 5 [F2] )

· Essa sociedade escravagista tem mão de obra montada em dois pilares: escravos e latifúndios (a terra é mercadoria, para aumentar os lucros – por isso fazem guerras constantes... Podemos lembrar Ap 6, os cavalos, que estudaremos logo adiante.

· Essa sociedade não respeita a vida humana. E, as maiores vítimas são os camponeses. Quando um povo perde a guerra, perde também a terra e se torna escravo – excluído.

· O projeto das comunidades cristãs é mostrar o avesso dessa história: uma comunidade de partilha, de solidariedade. É o projeto comunitário X o projeto de exclusão. Ou seja, o projeto da CASA X o projeto do império.

· Os judeus cristãos, embora poucos começam a incomodar, porque conquistam pessoas do império. Essas comunidades pequeninas não têm domínio da história. Elas não têm nada, são despojadas de tudo. Mas, dentro delas nasce a proposta apocalíptica.

f) Contexto interno e externo das comunidades do Apocalipse – contexto nacional.

· Situação externa das comunidades: Perseguições: 12,13: dragão jogado na terra, perseguição da Mulher (=comunidade); 12,17: o dragão foi combater o resto da descendência dela; 13,7: guerra contra os santos. Prisões: muitos já haviam sido martirizados. 2,13: Antipas, minha testemunha fiel, que foi morto entre vós, onde satanás habitava; 6,9: ao abrir o sexto selo, vi sob o altar as almas dos que tinham sido imolados por causa da Palavra de Deus; 7,13: vestes brancas, grande tribulação.

· Situação de Judá na primeira etapa da redação do Apocalipse: Guerra judaica e expulsão dos judeus cristãos das sinagogas. Nos anos 60 – 70 acontece a guerra judaica. Dois grupos sobrevivem nessa situação:

- os judeus fariseus e os

- judeus cristãos.

O império romano faz aliança com os judeus fariseus, porque eles controlavam as sinagogas, espaço que congregava o povo judeu. As sinagogas tinham várias funções:

- educação das crianças “1º. e 2º. Graus;

- ensino de técnicas de trabalho;

- oferta de possibilidades de trabalho;

- era local de assembléias para resolver questões da vila ou aldeia;

- era local de celebrações e orações;

- orientava o jejum; distribuía esmolas

- organizava os enterros;

- ensinava e conferia a prática das 613 leis que regiam a vida do povo;

- quem participava das sinagogas, em caso de guerras, tinha o direito de ficar no pelotão dirigido por judeus.

Ter controle sobre isso era de interesse do império. Através da aliança com os judeus fariseus, o império se apropriava das sinagogas e explorava o povo autorizando os fariseus a cobrarem todo tipo de dízimo.

A comunidade cristã entra em conflito com o império e com os judeus fariseus, por causa do projeto comunitário.

Por volta do ano 85, os judeus-cristãos foram expulsos das sinagogas. Como isso eles perderam acesso:

- ao comércio, ao trabalho; às decisões; ao culto, ao ambiente comunitário de oração; às esmolas, ao enterro de seus mortos em espaços dos judeus.

Em síntese, eles perdem a cidadania e ficam expostos à perseguição do império (Ap 2,9; 3,9; 8,5).

· Situação interna das comunidades: 2,2: cansaço; 2,4: diminuição do primeiro amor;

2,2: falsos lideres; 2,6.15: doutrinas erradas; 2,14; 16,20: problemas com as outras religiões que se misturavam com a fé em Jesus. 3,1: algumas comunidades estavam morrendo; 3,8: outras estavam bem fraquinhas. Havia nas comunidades gente muito pobre e indigente. Por outro lado, havia comunidades ricas, que se acomodaram... “não eram nem frias, nem quentes”... 3,16-17.

Outras citações sobre o sofrimento do povo: 16,6; 17,6; 18,24; 20,4.

O Apocalipse quer ajudar o povo a encontrar-se novamente, com Deus, consigo mesmo e com a sua missão. Quer animá-lo a não desistir da luta e a se armar para o combate.


g) Estrutura do livro do Apocalipse:

O livro do Ap está estruturado em forma de quiasmo (= estrutura concêntrica que pode ser comparada a um sanduíche: pão, manteiga, queijo, presunto (centro) + queijo, manteiga, pão). As idéias se organizam de forma paralela, de tal forma, que a mensagem central fica destacada no centro.

Vejamos:

A: Prólogo e saudação: 1.1-8;

B. A visão apocalíptica da Igreja: 1,9 – 3,22.

C. A visão profética da história: 4,1 – 8,1

D. As 7 trombetas. Releitura do Êxodo: 8,2 – 11,3

E. A comunidade cristã entre as Bestas: 12,1 – 15,4 (mensagem central do livro)

D´. As 7 taças. Releitura do Êxodo: 15,5 – 16,21.

C´. A visão profética da história: 17,1 – 19,10.

B´. A visão apocalíptica do futuro: 19,11 – 22,5.

A´. Epílogo – tempo presente: 22,6-11


2. Ap 1: as três portas de entrada


a) Primeira porta: Apresentação. Ap 1,1-3: coloca o resumo e o objetivo do livro. Define o livro como um apocalipse, isto é, Revelação.

b) Segunda porta: Saudação. Ap 1,4-8: apresenta o livro como carta amiga. Cria o ambiente comunitário de fé, de esperança e de celebração, no qual o livro deve ser lido e interpretado.

c) Terceira porta: Visão inaugural de Jesus. Ap 1,9-20: transmite uma experiência que faz perceber o alcance da fé na ressurreição para a vida das comunidades. É um resumo da mensagem do livro. É aqui que João recebe a ordem de escrever tudo para as sete comunidades.

Na apresentação você bate à porta. Na saudação, João vem abrir e convida para entrar. Na visão inaugural, ele nos leva para dentro e nos coloca em contato direto com Jesus, o Dono da Casa.

Depois de apresentar todos os títulos de Jesus, o povo das comunidades responde com gosto: AMÉM [1].



3. Ap 2-3: As cartas

1. Conhecer a situação das comunidades. O que cada comunidade tem de positivo e de negativo? Qual o ponto em que cada comunidade deve esforçar-se mais? Quais os perigos que a ameaçam? Comparar com os tempos de hoje.

2. Enfrentar a situação. Como João pede que as comunidades enfrentem a situação? Quais os recursos de que cada comunidade dispõe para enfrentar os problemas? Como enfrentamos estes problemas hoje?

3. Alimentar-se do Antigo Testamento. Quais as partes do AT citadas ou lembradas em cada carta? Quais as forças que João quer despertar nos Cristãos? Como acordar hoje a força que nos vem do nosso passado?

4. Aprofundar a fé em Jesus. Quais os títulos que Jesus recebe em cada carta? Qual o sentido e a força de cada título para a vida? Comparar com os títulos que Jesus hoje recebe nos cantos, celebrações, romarias etc.

5. Saborear as imagens e as comparações. Quais as comparações e imagens usadas em cada carta? De onde foram tiradas: do Primeiro Testamento, da natureza, da vida ou da cultura do povo? Qual o sentido de cada imagem para a vida?

6. Imitar o exemplo de João. Informar-se sobre a situação concreta das nossas comunidades [2].



4. Estudo de Ap 4 – 11: O roteiro do Novo Êxodo.


O contexto dos capítulos 4 – 11: esse texto foi escrito entre os anos 64 e 68, na época do imperador Nero. Com base no sistema escravagista, o imperador era divinizado. Nesse período a perseguição estava localizada em ROMA. A guerra judaica já havia começado. Os cristãos estavam perdendo suas terras. Era muito sofrimento!

Os capítulos 4 – 11 mostram que no mundo de cima Deus controla a história, portando, no mundo debaixo, a história também será controlada. Não tenham medo!

Vejamos o capítulo 4. Esses textos, na sua maioria, foram tirados do Êxodo.

Ler 4,8-11: percebamos aqui a descrição de Deus. Vamos dar destaque ao 4,8b – o nome de Deus, tirado de Ex 3,14-15=aquele que existe. Trata-se de um verbo, não de um nome. É o verbo “haiah”, ser, estar, existir: הָיָה . Deus é aquele que existe

As consoantes יְהוָה com as vogais de Adonai - dão o nome de Yehova. O desconhecimento disso fez com que se chegasse ao nome de “Jeová” (no mínimo é ignorância linguística.)

Que tipo de Deus as comunidades do Apocalipse estavam projetando, ou que tipo de Deus eles/as sonhavam? Eles retomam o Deus do Êxodo: 3,7: “Eu vi. Eu vi o sofrimento do meu povo. Eu conheço suas angústias. Eu desci para libertá-lo”. Deus conhece a história do povo. Ele está no seu meio para libertá-lo.

Aqueles grupinhos de escravos/as acreditavam em Deus como Senhor da história. Acreditavam que Ele está presente no dia-a-dia do povo. Ele estava, está e estará no meio do povo – era a proclamação daquelas comunidades sofridas.

Vejamos o capítulo 5:

O que é esse livro selado? É o livro da história. Quem consegue abrir esse livro? O Cordeiro.

O capítulo 5 mostra quem é o Cordeiro. Podemos ler Ap 5,6-9.

No lugar do Império, a comunidade “aposta” no poder do Deus libertador do Êxodo. Ele é o Senhor do universo, cercado dos 24 anciãos, ou seja, todo o povo de Deus. Esse Deus, esse povo, tem o privilégio de abrir o livro.

Quem é o Cordeiro, no Primeiro Testamento?

Essa imagem vem da festa Pascal: Ex 12.

O que é a festa Pascal? É a celebração da passagem da opressão para a libertação. Era a festa da CASA, onde os anciãos presidiam a celebração sem sacerdotes, e aí se partilhava a comida entre todos.

Agora, Jesus é o Cordeiro, ele está presente na casa e na partilha.

Quem consegue entender o livrinho, a história, é Jesus, mas é também as comunidades que lutam pela vida.

Que outro texto temos no Primeiro Testamento, que fala sobre o Cordeiro? São os Cânticos do Servo Sofredor, do profeta Isaías.

Primeiro Cântico: Is 42,1-9: o servo é o povo de Deus que tem a missão de proclamar o direito e a justiça.

Segundo Cântico: Is 49,1-5: a comunidade do povo de Deus assume essa missão.

Terceiro Cântico: Is 50,4-11: o servo sofre, mas resiste.

Quarto Cântico: Is 52,13 – 53,12: como consequência, o servo morre, mas continua vivo naqueles/as que lutam pela vida.

LER: Is 53,10 – ele assume livremente sua missão (lembrar Jesus que disse: ninguém me tira a vida, eu a dou – Jo 15,...)

Compreender o texto em seu contexto impede de celebrar, orar por um cordeiro passivo, longe dos conflitos. A simbologia apocalíptica é expressão do conflito.

Resumo: enquanto no capítulo 4 nós temos a comunidade que apresenta Deus, o Senhor da história – o Deus do Êxodo, que estava, está e estará presente – convive com o povo. Esse povo vive a partilha. Já no capitulo 5 temos a explicação de quem é o Cordeiro. Esse Cordeiro conhece a história – é aquele grupo que pratica a justiça, o direito, a solidariedade e anda na contramão do Império Romano, por isso é perseguido e morre... mas, continua vivo naqueles e naquelas que praticam o projeto de vida.

O Apocalipse não é uma espera passiva. O movimento apocalíptico nasceu no contexto dos grandes Impérios. São pequenas comunidades, que, como o Cordeiro, vivem na partilha, confiam, resistem e não entregam os pontos!

Capítulo 6 – esse capítulo traz uma análise da realidade, ou seja, as inúmeras guerras que o império fazia para conquistar terras e escravos.

6,3: cavalo branco – existem divergências entre os biblistas, quanto à interpretação desse cavalo. Ele é identificado, por alguns, como representação do império vencedor ou como o próprio verbo encarnado. Já o arco é símbolo do poder e a coroa quer lembrar o império, o sistema helenista, escravagista.

6,4: cavalo vermelho: as guerras de conquista para adquirir escravos, mercadoria, terra!

6,5: cavalo negro: comércio, lucro, exploração.

6,8: cavalo esverdeado – cor de cadáver: doença, peste

Havia guerras constantes produzindo fome, doença, morte, conseqüência da falta de higiene e descuido das elites.

Temos que ter presente, que o Apocalipse só é entendido a partir do chão de nossa vida.

Vamos ler: 6,9-11: esse Cordeiro, essa comunidade não está se auto flagelando. O sofrimento é conseqüência do projeto comunitário. Eles/elas estão inseridos/as na história – é tempo do imperador Nero, que causou grandes sofrimentos aos cristãos de Roma.

Esse pessoal volta ao Primeiro Testamento para entender o momento presente e conclui: “Vamos chegar lá”. Eles/as têm uma certeza absoluta: “Deus nunca abandona o servo” – isso eles e elas tiram dos Cânticos do Servo Sofredor de Isaías. Se vocês estão lutando pelo direito, pela justiça, o Deus do Êxodo está com vocês. Deus nunca abandona seu povo. Continuem caminhando na contramão do império romana.


Resumo:

As comunidades do Apocalipse estão numa sociedade helenista, escravagista. O Imperador é chamado o Senhor = κυριος o Kyrios. Ele está no topo da pirâmide e controla tudo. A maioria do pessoal que freqüenta as comunidades é escravo.

No momento, o imperador é Nero. Ele persegue as comunidades de Jesus, porque elas têm um projeto diferente do projeto do império: escravagismo X projeto comunitário.

O grupo das comunidades não tem o controle da história.

Nesse contexto, as elites se divertem levando os cristãos para os leões devorarem.

A sociedade é desumana. A vida das pessoas é mercadoria: (Ver Ap 18,13).


Surge o movimento apocalíptico, como uma força de esperança e resistência

a) Deus é o Senhor da história. A história não está perdida. No mundo de cima, Deus é o Senhor da história. Ele é o Deus do Êxodo que vive no meio do povo. Ele não é o Senhor que está por cima, como o imperador. “Vocês me chamam de Senhor, façam a mesma coisa que eu fiz” Jo 13. Nesse mundo de opressão e exclusão, quem consegue mudar as coisas é o Cordeiro.

b) O Cordeiro não é passivo. Essa reflexão vem de duas tradições antigas: a festa judaica – projeto de partilha e de solidariedade e também da imagem do Servo Sofredor que preservava a prática do direito e da justiça, ou seja, é um agir na contramão da história.

Cp. 7: Os sete anjos

Vejamos agora: Ap 8,1 – 10,7: leitura do texto.

Temos aqui a descrição da história do Êxodo. A ameaça das seis pragas como castigo de Deus para tentar convencer o grupo que está engajado no sistema do mercado, que esse não é o caminho.

Ap 10,8 – 11,13: É um acréscimo ao texto antigo.

Ap 11,19: última praga. O mundo se transforma no Templo do Senhor.

A comunidade descreve a mão de Deus como praga no Egito.


5) Estudo de Ap 12 – 22: O roteiro do julgamento final

Época de Domiciano – ano 95. Vejamos a realidade daquele momento. Ap 2,9 e 3,9 usam a expressão “Sinagoga de Satanás”. Relembremos o que aconteceu com os judeus cristãos nas décadas de 70 e 80. No ano 70, o império fez aliança com os judeus fariseus e no ano 85, os judeus cristãos foram expulsos das sinagogas.

Nesse contexto, os judeus cristãos, além do sistema escravagista do império, sem a proteção das sinagogas, estão expostos a todo tipo de perseguição. Assim, o primeiro livrinhos do Apocalipse 4 – 11, ou seja, o roteiro do Novo Êxodo, não era mais suficiente.

A comunidade elabora um segundo livrinho: Ap 12 – 22, onde descreve o roteiro do julgamento final: Novo Céu e Nova Terra X o sistema opressor. Aqui temos:

- o sistema do império, escravagismo, perseguição – é a grande BESTA.

- a perseguição dos judeus fariseus: as Bestinhas. Essas são piores, porque estão presentes no cotidiano, na intimidade das comunidades. A perseguição ficou mais forte e se espalhou por todo o império. Era preciso “aumentar a bateria”. O livro do Êxodo não era suficiente. A comunidade retoma a imagem da “nova criação” – todo o universo está dividido entre o bem e o mal.

Ap 12: a mulher representa o bem X o dragão que representa o mal. Essa luta começou no céu, no mundo de cima. Agora essa mesma luta acontece na vida das comunidades. A mulher, grávida, dando a luz, é a comunidade cristã, na sua fragilidade para gerar vida.

É interessante notar que o dragão nunca ganha. Ele é derrotado quatro vezes! Em:

* 12,4-5: Deus tira a mulher do perigo do dragão. O dragão não consegue devorar o filho.

* 12,7-8: Miguel derrota o dragão.

* 12,11: aquele que luta e testemunha derrota o dragão.

* 12,16: a terra mãe ajuda a mulher

O cap. 12 descreve a luta entre o bem (a mulher, a vida) X e o mal (o dragão, a morte). O dragão é vencido. Deus, o anjo, os cristãos, a terra, todo o universo, se unem para dominar o dragão.

Ap 13 – 14: esses capítulos mostram a realidade das comunidades nesse novo momento histórico e fazem uma proposta.

O grande dragão é o imperador Domiciano. Ele é a Besta maior. Ele é a reencarnação da serpente, do domínio do mal.

A Besta maior, ou o Dragão, delegou o poder às Bestinhas = os judeus fariseus.

Nessa época, os judeus fariseus já haviam feito aliança com o império e se tornaram seus representantes legais.

Ler: Ap 13,3: a besta com dois chifres exerce toda autoridade na presença da Primeira Besta!

O texto vai falar da Bestinha ou falso profeta: 16,3; 19,20. 20,10. Quem é essa Bestinha que faz aliança com a Besta maior? É a elite judaica, que está na liderança do povo, que faz a propaganda da Besta do Império romano, como o lucro, o comércio, para que continue esse esquema de escravidão. Nesse sistema, o povo não tem acesso à terra, ao trabalho, à comida!

Esse grupo da elite judaica age como apoio à Besta maior = sistema helenista, escravagista. Todos eles têm a “marca da besta na testa”, por isso podem atuar com toda liberdade.

Ap 14: como nos capítulos 4 – 6, a força da vida supera a força da morte.

Quem consegue construir um novo céu e uma nova terra? Aqueles/as que são virgens. Quem são eles/as? Trata-se de uma linguagem fechada. É uma imagem tirada do Primeiro Testamento. Quando havia uma guerra santa – guerra para autodefesa – os homens não podiam dormir com suas mulheres, em solidariedade com os que estavam na guerra. Ver 2Sm 11,10ss.

A Bíblia tem uma linguagem própria que só quem é da comunidade entende.

Aqui, a mensagem é a seguinte: não é Bestinha aquele que não se contaminou com a ideologia da grande Besta e permanece fiel ao projeto de solidariedade do Servo, numa espera ativa.

Ap 15 – 19: esses capítulos trazem várias lutas.

Ap 20: descreve a derrota definitiva.

Ap 21 – 22: a grande celebração da Utopia. Vamos ver: nessa Utopia, qual a grande realidade que transparece? Qual a proposta de mudança?


UTOPIA

“Arrisca teus passos por caminhos

Que ninguém passou;

Arrisca tua cabeça pensando

o que ninguém pensou”.

(militante anônimo, Maio de 1968/Paris)

“Para que serve a utopia?

Ela está diante do horizonte,

me aproximo dois passos

E ela se afasta dois passos.

Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos mais à frente.

Por muito que eu caminhe, nunca a alcançarei.

Para que serve a utopia?

Serve para isso: para caminhar”.

(Eduardo Galeano)



[F1] Pautar o texto Os judaizantes:

Judeus adeptos da fé em Jesus,

Judeus indecisos,

Judeus chamados débeis,

Judeus chamados fortes.

[F2] No ano 63 os romanos atracam na Judeia. Pompêu aprisiona mais de 200 mil judeus como escravos. 80 mil partem para Alexandria; 20/30 mil para Antioquia (escravos em Tarso). Paulo seria filho de um liberto que depois teria a cidadania romana. 60 mil são enviados por Pompêu para Roma, onde residiam na atual zona de Trastevere. Não é em vão que lá está o túmulo de Pedro – atual cidade do Vaticano.

Como chega na comunidade o anúncio da mensagem de Jesus? Não temos indícios claros. Os mais pobres se dedicam aos trabalhos mais pesados e insalubres. Os judeus ocupam a parte mais pobre da pirâmide social romana.


[1] Cf. Mestres, Carlos: “A entrada no livro do Apocalipse”.


[2] Como futuros padres e animadores de comunidades, nós poderíamos escolher a comunidade mais frágil e endereçar a elas uma salutar carta nesse Tempo Pascal, tendo como eixo o Ano da Fé, a JMJ, os 50 anos do VT, as ordenações sacerdotais, os gestos de esperanças oriundos do início do pontificado do Papa Francisco, a superação da miserabilidade, as posições em defesa da vida, entre tantos outros motivos.

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Notas- ΄Αποκάλυψις – Frizzo

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